Parte da Frente e Piscina

Folga do Profeta Diário. No momento, na minha vida, significa um dia de não-sofrimento. Não consigo me concentrar com Luke por perto, não consigo parar de pensar que o que eu fiz foi muito errado, não consigo olhar para ele, não consigo respirar.
Eu não tinha condições de sair para uma maratona de compras com Bella e Lys, como elas queriam, mesmo sabendo que precisava de uma distração. Passo o dia em casa, jogada na cama, meu cabelo um nó, pensando nos problemas e tentando ler alguma coisa. Um livro grosso. Para esquecer dos mesmos problemas que eu insisto em pensar. Ste, Luke, minha mãe, Dimitri, Vic... Muitos problemas.
Me assusto quando escuto a campainha, que me tira do meus pensamentos. Sozinha em casa, sou obrigada a descer para atender. Cometo o erro de não olhar quem é antes de abrir a porta. Luke. Não vou aguentar.
Olá, Luke. O que você quer?
Não sei como consigo achar minha voz para dizer isso. E nem como ela soa tão vazia, sem sentimentos. Quando, na verdade, eu só quero ele de volta. Dói vê-lo de muletas, mas é isso que insiste em me lembrar porque terminei com ele. Não o convido para entrar, mas não consigo relaxar. Fico tensa. Cada respiração parecia mais e mais impossível.

Ele quer saber porque eu o abandonei e diz que não é muito delicado terminar por carta, caso eu não saiba. É claro que eu sabia e doeu muito ouvir ele dizer que o abamdonei. Penso rapidamente na carta que eu lhe deixei e as palavras em que tanto pensei antes de escrevê-la. Na carta eu fui doce e disse que estávamos dando um tempo porque o que ele fez foi perigoso e poderia ter tido resultados piores. Mas eu sabia que ele ainda gostava de mim e, para o bem dele, deveria parar de gostar. Por isso fui mais rude, ou pelo menos tentei, porque ele, ali, na minha frente, deixava tudo mais difícil.
Ando com ele até as espriguiçadeiras da piscina e nós nos sentamos. Tento deixar a maior distância possível entre nós, na verdade, e acabo sentando na pontinha da espreguiçadeira do lado dele.
Eu sei que é indelicado, mas precisava vir para casa rápido, porque Stevie está passando por um momento difícil.
E agora vinha a parte mais complicada. Respiro fundo e faço um esforço para ingorar o aperto na garganta, a vontade de chorar. Olho bem nos olhos dele e digo:
Eu pedi um tempo, Lucian, porque tenho que rever meus sentimentos por você. Não sei se ainda o amo.
Como eu tive coragem?! Quis gritar, dizer que era mentira, mas isso era tudo pelo amor forte que sinto por ele. Por querer vê-lo bem. Feliz.
Acho que você deve seguir sua vida e... achar uma outra garota, mais legal, companheira, que te ame e, eu não sei, mais bonita...
Olhos nos olhos. Voz sem emoção. O mundo desmoronando por dentro.

Não torne tudo tão mais difícil, por favor.
Penso, quando ouço ele dizer que passamos bons momentos juntos, que ele não acredita que posso parar de amá-lo assim tão rápido, que ele se sacrificou por mim, nessa parte eu esqueço de como se faz para respirar, e que não vai existir outra garota, só eu. Não tiro os olhos dele nem por um minuto, com a expressão fechada, sem revelar nada e tão fria. Sem sentimentos. Não sabia que poderia ser assim, se tentasse, mas culpava inteiramente a genética. Meu pai era assim, e eu nem precisava conhecê-lo para saber disso.
Estou com um aperto no peito e por um momento tenho quase certeza que ele conseguiu, que vou parar com isso e voltar com ele. Vou voltar ao normal. Então eu olho para as muletas e fico tensa de novo. Não posso. Simplismente não posso. Ele poderia ter morrido, só para mim não se machucar, poderia ter sofrido danos maiores, enquanto eu ficava ilesa, poderia ter feito qualquer coisa, quaisquer que fossem suas consequências. Por mim. Para que eu ficasse bem.
Lembro dos momentos felizes com ele, e depois do ataque no casamento. Ele se jogando na minha frente e o meu desespero. Ele disse que não se arrependia, mas também disse que tinha se sacrificado por mim. E sacrifício é uma palavra muito forte. Lembro do momento em que nós dissemos um ao outro ''eu te amo'', em uma colina verde, ao pôr-do-sol, eu deitada no colo dele, com um vestidinho amarelo. Eu lembro a cor do vestido. Luke marcou muito a minha vida.
Foi o primeiro homem que eu tive coragem para dizer eu te amo, também. Foi meu primeiro namorado sério. Foi o meu primeiro em mais coisas também. E agora eu parecia estar jogando tudo pela janela. Fingir não amá-lo mais doía, mas eu sabia que era só assim que ele poderia me deixar. Comigo dizendo que está tudo acabado.
Não sei muito sobre provas de amor, mas essa era grande. A garota terminava com o garoto porque o namoro deles estava sério demais, a ponto de o garoto se sacrificar por ela. E ela não suportaria se algo acontecesse com ele, principalmente por sua causa. Ela seria capaz de sacrificar-se também. Isso soava muito Romeu e Julieta para mim, mas é a pura verdade. Tinha que continuar mesmo com aquilo de ''eu não te amo mais''? Porque achei que não iria conseguir falar mais nada. Me surpreendi ao ver que as palavras saíam.
Desculpa, Lucian, mas é verdade. E acho que você não deveria ter se sacrificado por uma garota que não lhe ama. E eu posso estar parecendo uma ingrata, deixando você agora, na hora que mais precisa de mim, mas vou lhe agradecer eternamente pelo que fez e, se não terminarmos agora, vai ser muito tarde depois. Não sei se algum dia vou conseguir lhe retribuir, mas espero que sim.
Tirando a parte de não amá-lo, todo o resto era verdade. Me sentia extremamente culpada por deixá-lo nesse momento de sua vida, mas se não terminasse agora, sabia muito bem que não ia conseguir fazê-lo depois. Desde o dia do casamento, quase que desejo que aconteça um outro ataque. Para poder ter a chance de salvá-lo, ou pelo menos livrá-lo de uma grande dor, com ele fez por mim.
Olho para minhas mãos por um momento, incapaz de encará-lo mais e não querendo deixar que ele visse as lágrimas que se formavam em meus olhos, e vejo algo ali. O anel. O anel de três anos de namoro que ele tinha me dado. Delicado, simples, com uma pedrinha azul em cima. Eu nunca o tirava, nem pensava na possibilidade. Sempre que o dia estava ruim, eu olhava para o anel e lembrava dele. E então ligava para ele, só para ouvir a sua voz. Às vezes nem tínhamos assunto, mas então marcávamos de nos encontrar e ficávamos juntos, e isso bastava. Eu poderia ser classificada como louca, por deixar o melhor namorado do mundo ir embora. Por mandá-lo embora. Mas era só porque o amava muito. Retiro o anel, levanto, e coloco-o onde estava sentada.
Desculpa, Lu.
Sussurro, tão baixo que não sei se ele conseguiu me ouvir ou não. Vou caminhando até a porta da casa, já sem segurar as lágrimas que agora escorriam quentes pelo meu rosto, mas paro na metade do caminho, de costas para ele. Incapaz de dar mais um passo. Incapaz de segurar meu próprio peso. Incapaz de respirar.

Quando escuto que ele foi embora, começo a chorar descontroladamente e me viro para olhar a piscina. Tem algo na espreguiçadeira onde ele estava. Vou até lá devagar, sentindo as lágrimas quentes, mas não fazendo esforço nenhum para limpá-las. Leio ''Sempre estarei te esperando se mudar de ideia'' e choro ainda mais, se isso for possível. Rosas lindas, azuis, formam as palavras e o anel está ali. Não conseguia olhar para ele, então, num ato impensado, joguei-o na piscina. Gritando de tanto chorar. Depois saí de casa correndo e fui para a rua vizinha, para a casa de Bella. Ela estava e eu expliquei tudo em meio a uma enxurrada de lágrimas. Ela entendeu perfeitamente, disse que eu precisava de uma distração, e, depois de tentar me arrumar e maquiar, o que não deu muito certo porque eu não parava de chorar, fomos a uma boate qualquer. Não curti nem um minuto de toda a noite e só bebi. Muito. Foi o primeiro dia da minha nova vida. Uma vida sem Luke, onde a bebida ocupava o lugar vazio dele no meu corpo.