Quarto de Stevie

Aparato no quarto dela e, só aí, a solto. Olhando para o seu rosto, não reconheci a minha irmãzinha. Não reconheci a menina doce, meiga, delicada e carente, que ela sempre foi. Seu rosto tinha algo de assassino. Tive medo. Medo de que ela pudesse fazer algo comigo. Chego a dar alguns passos para trás, mas retomo minha posição, mesmo a distância.
Ste, você não está legal... Eu acho que você deve ficar por aqui. Me escute, por favor. Posso fazer algo para ajudar?
Quem sabe eu poderia pegar um calmante, na cozinha. Decido fazer isso mesmo. Corro até a cozinha e volto em segundos com um comprimido e um copo d'água.
Toma o remédio, Ste. Vai fazer você ficar melhor.
Minha voz soava doce. Minnha irmã não estava bem. Eu havia terminado com meu namorado de anos. Meu pai tinha atacado o casamento da minha amiga. Minha mãe estava tentando consertar tudo. Minha vida estava de cabeça para baixo, nada podia dar mais errado.

Como vinha acontecendo, eu estava errada. Nada que estava ruim o bastante, não poderia ficar ainda pior. Minha irmã não aceita o remédio, discute comigo e me dá um tapa na mão, o que faz eu deixar cair o comprimido e o copo, que quebra imediatamente.
O que você fez?!
Digo, espantada. Escuto e sinto que piso nos cacos de vidro. Que bom que estou com uma sapato fechado. Então sinto uma tontura e me apoio na cabeçeira da cama de Stevie. Olho para minha mão por um acaso e vejo sangue. Meu sangue. Eu tinha pavor de ver meu sangue. O sangue dos outros é uma coisa, mas o meu é outra diferente. Isso me faz pensar que talvez eu devesse agradecer Luke por ter se jogado na minha frente e ter sido machucado no meu lugar, mas eu odiava ainda mais ver pessoas que eu amo sendo machucadas. Quando eu poderia ter evitado isso. Meus olhos se enchem de lágrimas e eu não sei se é por causa de Lu, ou pelo corte na palma da mão, que estava doendo, embora não tanto quanto Luke deveria estar sentindo... Não aguento mais, começo a chorar de novo.
Ste... Não faz isso comigo... Nem com a mãe... Por favor...
A doce Alice estava ali de novo. Tento não olhar para minha mão.
Vou ficar aqui com você até a mãe chegar.
Sento na cama dela e cruzo os braços.
O que aconteceu com você, Ste?

Ste tem um ataque e começa a jogar tudo no chão. Ela estava claramente fora de si e isso era perigoso. Poderia se machucar e machucar a mim. Quando ela grita, dizendo que odeia tudo e todos, percebo que tenho de agir, imediatamente. Não ia dar tempo de esperar minha mãe. Tiro a varinha e aponto para ela, quando o ela percebe o meu movimento, eu já havia lançado o feitiço, que atinge ela em cheio. Um feitiço do sono. Um sono bem profundo.
Arrasto ela para e cama e coloco-a ali, embaixo das cobertas. Dou um beijo em sua testa, como eu e mamãe contumávamos fazer quando ela era menor. Acabo manchando minha varinha, a roupa de Stevie e as cobertas com sangue, por causa de minha mão. Nem tento arrumar o quarto, mamãe tinha que ver a que ponto Ste tinha chegado. Sento ali em um sofá e espero pela chegada dela. As lágrimas escorriam de vez enquanto, mas eu as engolia. Não podia demonstrar fraqueza agora. Não nesse momento.

Quando mamãe chega, dá um jeito na minha mão e pergunta o que aconteceu.
Mãe, Stevie não está nada bem. No casamento, ela teve um ataque de fúria e consegui impedir que lançasse uma maldição. Ela queria machucar as pessoas, atacar... Ela queria... Ser como o nosso pai...
Minha voz diminui muito na última frase. Mas eu não podia parar por aí.
Tentei conversar, explicar, mas não surgiu resultado. Tive que trazê-la à força para cá e, chegando aqui, ela estava muito alterada. Tentei fazê-la tomar um calmante, mas ela recusou e destruiu o quarto inteiro. Tive que apagá-la.
Seria muito pedir minha vida normal, legal, perfeita (ou quase), de volta?
Ela não está agindo normalmente. Não sei o que fazer. A gente deve levar ela em um médico?
Um psiquiatra, quem sabe? Podem ser problemas emocionais...

Minha mãe fica visivelmente preocupada, dá alguns telefonemas, sai e volta com três remédios. Depois de fazer Ste tomá-los, mesmo desacordada, ela me avisa que agora ela terá que fazer uso frequente desses medicamentos, senão ela sai do controle.
Vai ser difícil... Vamos ter que ficar no pé dela...
Digo, enquanto olho para minha irmã, dormindo profundamente.
Mãe... Como Luke ficou? Com a carta?
Sabia que a doença da minha irmã era mais importante, mas é tão difícil admitir que ela realmente tem uma doença! E, meu namorado, quer dizer, Luke, era muito importante também. Precisava saber o resultado da minha ação decisiva.
E Vic? O que ficou decidido?
Uma das minhas melhores amigas, sequestrada de forma brutal... Se eu pudesse ajudar em alguma coisa...

Luke ficou péssimo, é isso que minha mãe quer dizer. Preciso de todas as minhas forças e controle emocional para não começar a chorar de novo. O que eu fiz? Foi melhor para ele...
Ela também diz que vai fazer o impossível para trazer Vic de volta e percebo que não é um trabalho tão fácil assim. Ela e os aurores estavam lidando, possivelmente, com meu pai, alguém complicado, inteligente e não muito bonzinho.
Você também deveria descansar, mãe. Acho que amanhã, quer dizer, hoje, vai ser um dia cheio pra você.
Já passava das 4 da manhã, por isso eu estava meio esgotada. E pelas reações de Stevie, claro. Dou um beijo em mamãe e vou para o meu quarto. Durmo quase imediatamente, apesar de tudo.